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Maio, 2006
A mais famosa instituição de ensino de Leopoldina e, por muitos anos, das mais importantes do Estado de Minas Gerais, o
Gymnasio Leopoldinense foi fundada em 3 de junho de 1906 pelos irmãos, José Monteiro Ribeiro Junqueira, advogado e político, e Custódio Ribeiro Junqueira, médico.
Como consta do livro
Lições e Recordações, do Professor Oíliam José, pág. 42, Ed. do Autor, 2002, Belo Horizonte, MG, o
Colégio Leopoldinense “não se tornou conhecido e procurado sem motivos dignos de louvor, ministrava aplaudido ensino e mantinha louvado internato. (...) Preparou os melhores alunos para o exercício das mais variadas funções e profissões, como continua fazendo. Basta salientar que teve em Milton Soares Campos e Antonio Pedro Braga alguns de seus alunos. Todos esses fecundos resultados decorreram e decorrem dos dedicados Diretores que teve e do Corpo Docente, que sabia cuidadosamente formar”.
Realmente, ao longo dos muitos anos de sua existência - como Colégio de vocação regional até o fim dos anos 50, mercê do grande internato que possuía, recebendo alunos de toda a Zona da Mata Mineira, do Vale do Rio Doce, Campo das Vertentes, Vale do Jequitinhonha, municípios do norte do Estado do Rio e de recantos os mais distantes - passaram pelo
Colégio Leopoldinense alunos que se tornaram figuras importantes da vida pública nacional, tais como Ministros de Estado, Ministros de Tribunais Superiores, Desembargadores, Juízes, Escritores, Artistas Plásticos, Profissionais Liberais os mais diversos, Empresários, Comerciantes, Políticos, etc. Em razão disto, uma divisa bastante imodesta, mas não de todo exagerada, dizia: “Em qualquer parte do Brasil existe alguém que se formou no
Colégio Leopoldinense”.
Mário de Freitas, em seu livro
Leopoldina do Meu Tempo, pag. 47, ao mesmo tempo em que fala da comoção, na cidade, pelo falecimento, a 7 de fevereiro de 1926, do ilustre Diretor do Ginásio, José Ribeiro dos Reis, relaciona os professores que aqui encontrou naquele ano de sua chegada a Leopoldina. Mestres que marcaram época, cujos nomes a história registrou: Carlindo de Alvarenga Mayrinck, Henrique Barbosa da Cruz, Jesus Ferreira Varella, Oswaldo Christróvam Vieira, Militino Rosa, José do Patrocínio Pontes, Desembargador Custódio Lustosa, Gustavo Monteiro de Castro, Joaquim de Souza Guedes Machado, Felix Malburg, Antonio de Oliveira Guimarães, Antenor Machado (o
Machadinho), Júlio Ferreira Caboclo, Antonia Monteiro Junqueira.
Aliás, sobre o
Machadinho, Mario de Freitas o descreve como “cientista de renome internacional”, figura simpática, risonha, extremamente singelo no trajar-se, “humilde e modesto de causar pasmo”. Certa vez - revela Mário - um amigo perguntou a Antenor Machado a razão de ele vestir-se de forma tão despojada, quase incompatível com o nome que desfrutava nos meios culturais e sociais da cidade. A resposta foi:
-
Aqui, todos me conhecem, a roupa pouco significa.
Tempos depois, convocado pelo Governo Federal - segundo o radialista e grande conhecedor da história de Leopoldina, José Américo Barcelos,
Machadinho foi designado a assumir a direção de um grande Laboratório Farmacêutico, alemão, por ocasião da Segunda Guerra Mundial - transferiu-se para o Rio de Janeiro e, lá, não alterando hábitos pessoais, o amigo voltou a cobrar-lhe elegância compatível, ao que Machadinho respondeu:
-
Aqui no Rio ninguém me conhece, a roupa pouco significa...
(Foto: Gymnasio Leopoldinense antes da reforma.)
No Gymnásio funcionou a Escola de Farmácia e Odontologia do
Gymnásio Leopoldinense, fundada em 17.01.912 e extinta em 1930; A Escola de Odontologia que foi fechada em 1921 e, a de Farmácia, em 1930;
Instalou-se a
Escola Normal, cujas matrículas para o Curso Normal foram abertas em 01.12.1906;
Os cursos de Obstetrícia, Agrimensura e Belas Artes, cujas matrículas foram abertas em 14.02.1909, mesma data das matrículas para os Cursos de Farmácia e Odontologia;
Um Jardim de Infância, anexo à
Escola Normal, inaugurado em 27.07.1909;
A
Escola de Aprendizado Agrícola, instalada em 03.06.1914;
A
Escola de Comércio Professor Botelho Reis, filiada à
Escola Livre de Comércio de Minas Gerais, em 19.01.1930.
Do arquivo do jornal
Reencontro, sob os cuidados de seu editor e redator José Antonio Almeida, obtivemos a seguinte cronologia de datas marcantes do
Gymnásio Leopoldinense: - 01.12.1906, abertura das matrículas para o
Curso Normal; - 15.01.1907, abertura das matrículas para o
Curso Ginasial; - 14.02.1909, abertura das matrículas para os
Cursos de Farmácia, Odontologia, Obstetrícia, Agrimensura e Belas Artes; - 27.07.1909, inauguração do
Jardim de Infância; - 17.03.1910, primeira diplomação de bacharelandos e normalistas; - 17.01.1912, fundação das
Escolas de Farmácia e Odontologia; - 03.06.1914, instalação do
Aprendizado Agrícola; - 21.03.1918, equiparação da
Escola de Farmácia à
Escola Oficial; - 13.05.1918, Construção do primeiro bloco do atual prédio (o lado esquerdo do prédio), projetado pelo Dr. Ormeo Junqueira Botelho; - 1926, construção do segundo bloco, dotando o prédio de seu formato definitivo; - 19.01.1930, a
Escola de Comércio Professor Botelho Reis é filiada à
Escola Livre de Comércio de Minas Gerais; - 1932, equiparação do
Gymnásio aos Colégios Oficiais; - 18.12.1932, início das inscrições para o
Curso Comercial; - 1934, criação da
Liga Esportiva do Colégio Leopoldinense, o depois cognominado
Esquadrão Fantasma; - 25.04.1941, instalação da Sirene; - 25.03.1942, instalação do
Curso de Contador; - 15.03.1943, início dos
Cursos Clássico e
Científico; - 1946, transferência ao Bispado; - 14.02.1955, assunção do Colégio pelo Estado de Minas.
Na
Escola de Farmácia lecionavam, como informa Mário de Freitas, os professores Militino Rosa, Antenor Machado, Oswaldo Christóvam Vieira e Antonio de Oliveira Guimarães.
O
Gymnásio passou de seus fundadores ao Bispado de Leopoldina no início do ano de 1946, quando era Diretor o Prof. Alziro Azevedo de Carvalho.
Sob a Diocese, vieram a ser seus Diretores, entre 1946 e 1948, o Pe. José Domingues e, por trinta anos, de 31.01.49 a 09.11.79, o Mons. Guilherme de Oliveira o qual, como se vê, continuou na diretoria após a estadualização.
Em 1955 foi o
Colégio Leopoldinense transferido do Bispado de Leopoldina ao governo do Estado de Minas Gerais.
O Prof. Oíliam José, à página 44 do livro
Lições e Recordações, acima citado, tece importantíssimas considerações sobre os “heróicos esforços” do Bispo Diocesano de então, Dom Delfim Ribeiro Guedes, secundado por Mons. Guilherme de Oliveira, junto aos governadores de Minas, Juscelino Kubitscheck e Clóvis Salgado, e junto a deputados estaduais, para obter a estadualização do Colégio e, com isto, garantir ensino ginasial e colegial gratuitos a toda juventude leopoldinense.
Inúmeros obstáculos tiveram que superar – diz o Prof. Oíliam – para que as autoridades aprovassem a compra do Colégio. A maior delas foi a falta de recursos financeiros por parte do governo de Minas.
Com efeito, aos 14.02.1955 o Colégio foi assumido pelo Estado de Minas, mas a escritura de Compra e Venda só veio a ser assinada em 7.12.1955. O preço recebido pela Diocese foi, quase que inteiramente, consumido nas indenizações trabalhistas ao professorado e ao pessoal administrativo – informa o Prof. Oíliam.
Transferido ao Estado, o Colégio passou a denominar-se
Colégio Professor Botelho Reis, depois Colégio Estadual Professor Botelho Reis, com a Lei 1.388, de 23.12.1955, assinada pelo saudoso filho de Leopoldina, então Governador do Estado, Clóvis Salgado da Gama que, na qualidade de Vice-Governador, assumira a chefia do Executivo Mineiro em 1955, ocasião em que Juscelino Kubitschek precisou desincompatibilizar-se para candidatar-se à Presidência da República.
(Foto: Prédio onde foi fundado, em 1906, e passou a funcionar o Gymnasio Leopoldinense. No prédio novo, corresponde à ala esquerda, reformada.)
Tem-se, portanto, que graças à visão sociológica e humana desses homens ilustres, Dom Delfim, Mons. Guilherme, Juscelino Kubitscheck e Clóvis Salgado, um colégio que antes, por ser particular, só tinha condição de oferecer instrução a alunos cujos pais tivessem recursos para pagar seus estudos, a partir da estadualização passou a receber em seus bancos escolares toda a juventude leopoldinense, independente da condição econômica.
Nós, ex-alunos da fase anterior à estadualização do Colégio, fomos testemunhas de uma realidade social lamentável, constrangedora. Não havia em Leopoldina, como certamente ocorria em outras cidades de igual porte do país, educação secundária gratuita. Sendo assim, só os que podiam pagar gozavam desse privilégio. Como resultado, até os derradeiros anos da década de 50, à exceção das escolas primárias, todos os colégios de Leopoldina resultavam ser
colégios para brancos, ou seja, para os que podiam pagar! Isto equivalia à absoluta negação, entre nós, por cerca de 60 anos após a Lei Áurea, do direito de instrução secundária à juventude pobre (condição em que, principalmente, a juventude negra se incluía em sua quase totalidade). A monstruosidade ganha maior vulto se lembrarmos que Leopoldina, do início do Século XX, detinha o segundo maior contingente negro do Estado de Minas - inferior, apenas, a Juiz de Fora.
Isto deixa muito clara a grandeza humana, o elevado espírito do nosso primeiro Bispo, Dom Delfim Ribeiro Guedes, um homem de aguda visão social que soube enxergar muito além dos interesses materiais que administrava. Preferiu transferir o enorme patrimônio imobiliário do Bispado - o intangível histórico de valor incalculável de um dos mais conceituados estabelecimentos de educação do país - ao Estado de Minas, em troca de nada, porque tinha olhos voltados para o bem da juventude injustiçada de nossa terra.
E pensar que, ainda hoje, pessoas existem incapazes de alcançar o sentido de certas medidas de inclusão social e ações afirmativas em andamento no país. Cegos para a não-inexistência de uma única sociedade brasileira, existindo, sim, várias sociedades brasileiras - como tão bem observa o teatrólogo Augusto Boal. São mentalidades tacanhas, insensíveis às distorções do
establishement colonizador europeu, felizmente vencida e ultrapassada no tempo e no espaço.
Pelo Colégio passaram, pela ordem, os seguintes Diretores, desde a sua fundação, em 1906: Henrique Barbosa da Cruz, Dr. Jacques Dias Maciel, Prof. José Botelho Reis, Dr. José Monrteiro Ribeiro Junqueira, Dr. Carlindo Alvarenga Mayrinck, Antonio Carlos de Azeredo Coutinho, Prof. Alziro de Azevedo Carvalho, Mons. José Domingues Gomes, Dr. Lydio Machado Bandeira de Mello, Mons. Guilherme de Oliveira, Prof. Geraldo Bertochi, Prof. Marcelo Barroso Domingues, Rodrigo Arantes Queiroz, Iran Fajardo, Fernando Miranda Vargas.
Com auxílio da obra, já referida, do Professor Oíliam José, mencionaremos a seguir, alguns professores da fase em que o Colégio pertenceu à Diocese, quase todos colegas de magistério do autor e por ele nomeados na página 43 e 44: Sargento Adélio Silveira de Souza, Prof. Antonio Moura de Oliveira Guimarães, Profª. Belarmina Soares Maranha, Profª Carmen C. Spínola, Profª. Conceição S. dos Santos, Dr. Ennio Fadda, Tte. Enock de Araújo Barbosa, Dr. Francisco Reif de Paula, Dr. Francisco Ribeiro Junqueira, Dr. Geraldo de Vasconcelos Barcelos, Dr. Geraldo Bertocchi, Dr. Hamil J. A. Adum, Prof. João Batista Alvim, Dr. Joaquim Barroso Guedes Machado, Profª Maria Aparecida Monteiro Ferreira, Profª Maria Guilhermina Vilela Fajardo, Profª Maria Regina Monteiro de Castro, Profª Nely Soares dos Santos, Profª Olímpia Antunes Duarte, Sub-Tenente Otávio L. Pereira, Prof. Rodophe Gibrat, Profª Silvia Souza
Werneck, Prof. José de Andrade e José Ribeiro Leitão.
A maioria destes, como o próprio Professor Oíliam - que, da Academia Mineira de Letras continua a nos brindar com aulas preciosas através de seus livros - os preceptores muito queridos da nossa própria passagem pelo
Colégio Leopoldinense, na década de 1950.
Infelizmente, muitos deles já não vivem, elevados que foram aos serviços da Divina Reitoria. Permanecem, todavia, presentes em nossos corações porque os mestres não passam. Eles sobrevivem nos mais luminosos desvãos de nossas almas, com suas palavras, com suas idéias, seus gestos, suas imagens, e isto não é mais que um pouco da imortalidade de cada um deles se insinuando, repercutindo luminosamente dentro de cada um de nós.
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(Publicada no jornal LEOPOLDINENSE de maio de 2006)